O beijo de Rodin

Pois é, hoje é o Dia Mundial da Poesia. Por isso, para assinalar o dia, hoje apetece-me fugir (só uma escapadelazinha!) do registo habitual para um texto mais sensual, mais adulto. Algo que já escrevi há bastante tempo, em 2001, e que foi publicado no site da Porto Editora, www.educare.pt, na secção Novos Talentos. Este poema, se o for, faz parte de um conjunto de textos que intitulei “Restos de poemas que não sei escrever”.





Da metamorfose do rochedo
Monstro de terra e de mar
Áspero, sólido, horrendo
Liberta-se aos poucos
Uma forma de arte... e de amar


Os músculos apenas se descobrem
Na denúncia da pulsação esquecida
Das mil energias que percorrem
A pedra viva.


Na lisura da pedra suada murmuram discretas veias
De dois corpos em concha
Onde o tempo construiu suas imortais teias
De brilho e de cotão


Pelo torso tímido ela se enleia como Hera
Que o quer seu
E o seu gesto de jovem primavera
Guarda em si o fogo da paixão


Na brisa subtil desta ternura
Esquecida de si mesma ela se dá
E da rocha de uma teimosia dura
Os pés voam e ganham o ar.


O seu seio erguido se alonga no abraço
E roça dele o peito pujante e vigoroso
E este toque sentido
Desperta um desejo ardente e ansioso.


O amante, mais contido no seu movimento
Pousa a sua mão grande e viril
Na carne rija e sem tempo
Da sua ninfa de cinzel e vento.


E na coxa que a luz revela... firmeza
E a sombra arredonda,
Há a secreta beleza
De um segredo profundo... no escuro.


Os olhos fechados no pudor do sentimento
O tremor quente dos lábios nas órbitas nocturnas.
A urgência do desfloramento
Na avidez das ternas garras, tenra luz.


Numa penumbra sem rostos
Dois corpos, um só ensejo
Um homem, um mulher
Um só gesto, um eterno beijo.


Ana Tarouca, 2001.



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